Bendito seja Deus que na sua Misericórdia nos fez renascer

Bendito seja Deus que na sua Misericórdia nos fez renascer

 

 

Leituras: Act 2, 42-47; Sal 117 (118), 2-4. 13-15. 22-24; 1 Pedro 1, 3-9; Jo 20, 19-31

 

 

 

Neste Domingo da Misericórdia, o Evangelho que acabámos de escutar é um presente da Misericórdia, é uma página muito bela. Recorda-nos que desde o primeiro Domingo de Páscoa, de 8 em 8 dias, Jesus não cessa de se apresentar no meio de nós, de nos dizer «a Paz esteja convosco» e de realizar este mesmo dito com o Dom do Seu Espírito, insuflando-O sobre nós. No entanto, hoje, marca-me a 2ª leitura. Diz-me muito. Porque me faz viajar até ao momento da minha ordenação presbiteral, até ao momento daquela experiência de «primeiro amor». Quando presidi pela primeira vez à Eucaristia, no Seminário de Bragança, a 1ª leitura era esta passagem da 1ª Carta de São Pedro. Escutá-la, hoje, aqui, neste tempo pascal, como que me assiná-la um renascimento. Ela própria, como o Evangelho, fazem-nos tomar consciência que a Páscoa é um renascimento.

No entanto, para que este renascimento aconteça em mim e em todos, é preciso da nossa parte não só escutar esta passagem, mas fazer com ela algo muito simples: repeti-la muitas vezes, como oração que é. Trata-se de uma belíssima, porque pedagógica, oração, este Benedictus. Diz-nos, antes de mais, que Bendito é Deus, só Ele é Bom, só Ele é Santo, só Ele é Misericórdia; diz-nos depois que na sua Misericórdia nos refaz pelo Mistério Pascal de Cristo, pelo Dom do Espírito; e diz-nos por fim, que tudo isto redunda numa vida assinalada pela esperança.

«Bendito seja Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que, na sua grande Misericórdia, nos fez renascer, pela ressurreição de Jesus Cristo de entre os mortos, para uma esperança viva» (1Pe 1, 3)

Dizer, rezar muitas vezes «bendito seja Deus que na sua Misericórdia nos fez renascer» significa repeti-lo mesmo quando a nossa fé passa pelas provas a que mesma leitura também acena. É fácil no meio da provação dizer «isto é uma desgraça», mas o que se nos pede que digamos, como discípulos de Cristo, é «bendito seja Deus que na sua Misericórdia nos fez renascer» e que transforma, ainda agora, a desgraça em graça, a vida medíocre em vida divina, a cegueira em participação no Seu olhar sobre a realidade. Este mergulhar o nosso olhar no olhar divino é a única forma de não sermos cegos, de não olharmos para a história de uma forma perversa. Rezar, no meio das provas, no meio do crisol dos nossos dias, «bendito seja Deus que na sua Misericórdia nos fez renascer» implica assumir dois discursos: por um lado, é mostrar ao mundo que vivemos assinalados pela esperança acreditando que Deus fez a partir do nada e refaz a partir do mal, por outro, e mais importante do que isso, é mostrar a Cristo que estamos abertos ao Sopro da manhã de Páscoa, continuamente abertos como terra árida, sequiosa, gretada.

Recebendo este Sopro, hoje e aqui, e em cada Sacramento em que dizemos por excelência «bendito seja Deus que na sua Misericórdia nos fez renascer», ficamos capacitados mais do que a fazer milagres, a descobri-los na vida dos outros. Penso que era também isto a caracterizar a primeira comunidade cristã. Diz-nos a 1ª leitura que eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à comunhão fraterna, à fracção do pão e às orações. Mas a assiduidade estende-se ao temor que sentiam diante dos prodígios e milagres dos Apóstolos, porque eram inúmeros. Continuemos nós, hoje, assim, a ser participantes nesta assiduidade, como curiosos indagadores dos prodígios alheios, como curiosos indagadores dos milagres vizinhos. Que Deus nos dê a graça de fazermos disto a fonte da nossa alegria, porque mesmo sem O vermos, amamo-l’O e acreditamo-l’O a agir nos nossos colegas e irmãos quando se constroem e constroem.

Uma palavra última sobre Tomé, chamado Gémeo. Nosso irmão gémeo, tão semelhante a nós. As palavras que Tomé escutou são as mesmas que nós, em cada Domingo, de 8 em 8 dias, até que Deus queira, experienciamos. Celebrar a Eucaristia, anunciando a morte do Senhor e proclamando a Sua ressurreição enquanto O esperamos até que Ele queira, é escutar e viver isto: José Luís «põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; aproxima a tua mão e mete-a no meu lado; e não sejas incrédulo, mas crente». Renascer! Renascer a partir da fé é o que se nos oferece, renascer a partir deste Encontro, para fazer renascer a semana, para fazer renascer a vida, para fazer renascer o sacerdócio, seja ele baptismal ou ministerial. É o fruto da Misericórdia!

Renasçamos, então, a partir daqui…

 

                             Pe. José Luís Pombal